by Dalton Carneiro
Sábado 27 setembro 2008, 18 horas. Estou em pleno papel agora a contar. Tudo aquilo que aconteceu, juntando num saco, despejando num liquidificador, batido em sopa de letrinhas, dá um livro... mais até. Folhas e mais folhas soltas, centenas daquelas folhas soltas na relva de Walt Whitman. Mas não se trata de escrever e sim de dizer de tudo isso. Que eu estou ainda maravilhado hoje, mas de um maravilhamento diferente daquele de 26 setembro 2008 até as sete e pouco. Maravilhado pelo mundo que eu comecei a conhecer ontem e que me deixou assim, desesperadamente maravilhado.
Um arraso, de fuder, do caralho, esplêndido, qualquer adjetivo desses serve hoje. Como pode ser que eu, tendo braços e pernas como todos eles, só tenha lhes oferecido os olhos em troca de tanta beleza? Fossem músicos, teria sido uma sessão de improviso de jazz. Músicos são pessoas que tocam instrumentos, dançarinos são pessoas que dançam. Eu sou uma pessoa que não dança. Melhor disse a mineirinha, só meus olhos e meu espírito dançam. O que uma Multikulti espera de pessoas que não dançam mas que gostam de ver a dança? Vocês não acham que numa Multikulti não deveria haver platéia, e portanto arquibancada? Vocês dançaram com um sofá, com almofadas, com um quadro, com as próprias arquibancadas, uns com os outros. Quem estiver ali como eu estava ontem, colhendo sem oferecer, não devia ter onde estar que não pudesse ser atingido por aquela volúpia, como almofada ou piso, ou como olhos que dançam afinal. Incrível que isto é que era o mais lindo, nenhum de vocês estava ali para aparecer para ninguém. Dançam porque respiram, dançam por dançarem. Olhar...? Claro que pode, tudo pode, quem vai dizer que não? Cada um de vocês teve um tempo até chegar ao ponto de Lúcio. Qual o meu tempo? Estar presente no palco e na vida com o corpo inteiro, imune a qualquer juízo de quem quer que seja. Até agora eu não sei quem são vocês. Se são dançarinos e vivem disso, uma hora vocês se exibem para uma platéia que paga para lhes contemplar. Se não vivem de sua dança, estão ali só para viver no tempo que sobra do trabalho. Sejam quem forem, estão presentes em minha vida hoje pelo que fizeram ontem na Multikulti. Eu já dancei na vida. Todo mundo dança. Mas o que eu vi ontem eu quero ser também. Quero amigos e amigas em cima de quem eu suba ou sob elas esteja e diante de quem não haja pensamento mais forte nos ligando que não possa ser triturado pelo menor de nossos músculos num salão. Dançar também é não habitar uma caverna. Alma e corpo, nem pensar! Só pássaros e lúcios dançam. A pessoa inteira é aquilo ali. Sem nem eu a estar como agora a descrever isso, porque fica pressuposto que existe algum ponto de vista do qual alguém pode apreciar outro alguém que dança.
Desconfio no entanto também de todos estes pensamentos. Correm o sério risco de estarem contaminados pela poeira da imobilidade. Eu agora apenas dei ao pensamento o livre curso que neguei ao corpo inteiro ontem. Nenhuma vez fui à primeira frase para corrigir contexto e lógica. Faço chegar a vocês, dança e dançados, que tanto esperei, algo além de aplauso. Como se faz para ser assim?
o que é o Momento Multikulti?
O Momento Multikulti é uma iniciativa do Centro de Estudos em Movimento, parte do projeto Técnica Corporal, Tradição e Performance, coordenado pela Profa. Dra. Ciane Fernandes, da Escola de Teatro e do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da UFBA.
O evento mensal consiste num espaço aberto para troca de experiências e pesquisas interculturais, sempre a partir da improvisação artística – dança, canto, poesias, vídeos, etc.
O corpo em performance é nossa opção.
O evento é inspirado na Rádio Multikulti de Berlin, que toca músicas de todas as partes do mundo, e no Barefoot Boogie, de New York, onde as pessoas dançam sem sapatos uma noite de sábado por mês.
O evento mensal consiste num espaço aberto para troca de experiências e pesquisas interculturais, sempre a partir da improvisação artística – dança, canto, poesias, vídeos, etc.
O corpo em performance é nossa opção.
O evento é inspirado na Rádio Multikulti de Berlin, que toca músicas de todas as partes do mundo, e no Barefoot Boogie, de New York, onde as pessoas dançam sem sapatos uma noite de sábado por mês.
quinta-feira, 9 de outubro de 2008
Multikulti, a meus olhos, cena 2
by Dalton Carneiro
Sexta 26 setembro 2008, sete e pouco. Uau... estou em pé! Quede eu, caverna, estátua, quede todo mundo... eu sei lá! Espetáculo certo! Portão, escada, porta da sala 5. As pessoas entram aos poucos, eu fico antes do burburinho. De repente, eu dentro. Mais passarinhos, arrumando tudo. Essa é fulana, essa é sicrana, esse aqui é Saulo, ali não sei quem, oi oi oi todo mundo, esse é Dalton um amigo. Estou dentro! Uma outra caverna, olhando bem... e a minha, sei lá eu da minha, agora tenho para onde olhar – Lúcio! Lindo Lúcio. Choroso, confuso ali, com toda aquela viração. Na vida, ele não se atrapalha nunca; inventou até uma nova língua! Quem vai dizer que não? Um canto da sala 5 tem quatro bancadas, quase toda ela é palco. Olá vermelho, oi verde, e você telão como vai tem refletido muito... agora tem um pouco de ordem no meu pensamento. Não sou mais espera, o tempo é hoje, as pessoas são aquelas. A festa não é minha, nunca foi... dançam aquelas pessoas por aí pela vida e hoje ela é aqui, a la Multikulti, Barefoot Boogie New York, pés descalços. E então...?
Subi mais dois degraus, parede às costas, o resto eu não sei. Só fui lá para esperar e agora que não precisava mais esperar... eu não sei. Mas aqueles passarinhos saberão. Eles comungam daquilo tudo. Não pense, ouça a música e faça. Não penso, ouço a música e olho. Todo palco é uma folha em branco, isso eu vi. O mais difícil é o primeiro risco, o que ninguém quer dar. Ai daquela Multikulti não fosse Lúcio. Tá faltando criança nesta festa, ouvi Ciane dizer. Mas tinha, como tinha... Lúcio foi apenas o primeiro a chegar.
Sexta 26 setembro 2008, sete e pouco. Uau... estou em pé! Quede eu, caverna, estátua, quede todo mundo... eu sei lá! Espetáculo certo! Portão, escada, porta da sala 5. As pessoas entram aos poucos, eu fico antes do burburinho. De repente, eu dentro. Mais passarinhos, arrumando tudo. Essa é fulana, essa é sicrana, esse aqui é Saulo, ali não sei quem, oi oi oi todo mundo, esse é Dalton um amigo. Estou dentro! Uma outra caverna, olhando bem... e a minha, sei lá eu da minha, agora tenho para onde olhar – Lúcio! Lindo Lúcio. Choroso, confuso ali, com toda aquela viração. Na vida, ele não se atrapalha nunca; inventou até uma nova língua! Quem vai dizer que não? Um canto da sala 5 tem quatro bancadas, quase toda ela é palco. Olá vermelho, oi verde, e você telão como vai tem refletido muito... agora tem um pouco de ordem no meu pensamento. Não sou mais espera, o tempo é hoje, as pessoas são aquelas. A festa não é minha, nunca foi... dançam aquelas pessoas por aí pela vida e hoje ela é aqui, a la Multikulti, Barefoot Boogie New York, pés descalços. E então...?
Subi mais dois degraus, parede às costas, o resto eu não sei. Só fui lá para esperar e agora que não precisava mais esperar... eu não sei. Mas aqueles passarinhos saberão. Eles comungam daquilo tudo. Não pense, ouça a música e faça. Não penso, ouço a música e olho. Todo palco é uma folha em branco, isso eu vi. O mais difícil é o primeiro risco, o que ninguém quer dar. Ai daquela Multikulti não fosse Lúcio. Tá faltando criança nesta festa, ouvi Ciane dizer. Mas tinha, como tinha... Lúcio foi apenas o primeiro a chegar.
Multikulti, a meus olhos, cena 1
by Dalton Carneiro
Sexta 26 setembro 2008, 18 às 22 horas. Sala 05 da Escola de Teatro. ...para nos encontrarmos, dançarmos, trocarmos informações e paixões interculturais. Fui convidado por Ciane. Para ela, um momento de criação e exercício de sua vida de dançarina. Para mim, uma chance de reencontrar a dança.
Sexta 26 setembro 2008, 14 horas e eu em casa sem saber o que visto, o que faço em seguida e o que ainda tinha que fazer para garantir a mim mesmo que lá estaria. Nos últimos anos, sempre dei um jeito de me esquivar para dentro da caverna quando o mundo me enchia de desejos. Alguns kilos mais gordo, dores aqui e acolá, a alma encarcerada num corpo de pedra. Sobrevivendo graças a chamas de lembranças mortas de tempos vivos. Mortas, eu disse mortas? Esta não estava. Há uma semana palpitava por esse encontro. A estátua e a dança, alguém já disse por aí... e essa imagem é que me movia.
Sexta 26 setembro 2008, 16 horas e eu na rua, no ônibus, barra, campo grande, jardins, plantas, canela, reitoria, bom preço, escola de teatro, jardim, banco, a estátua senta ali às 17:30 e espera a sua bailarina. Vejo tudo sem me sentir visto. Só uma estátua mesmo podia imaginar olhar sem ser olhada. De dentro, do fundo da caverna que eu habito, o mundo inteiro soa esconderijo. Sei que não é, mas vale o que eu sinto e não o que eu sei. Sei por exemplo qual é a sala 5, de outros carnavais, lembranças mortas por ali me assombrando. Atores e atrizes ensaiam algo em outra sala além. Altas entonações, cabelos e braços pelas janelas, atores e atrizes pelo jardim andando como passarinhos, pulinhos e beijinhos, giros, gritinhos. Pedaços de conversa voam como flechas sem me atingir. Alguém aparece de uma porta com uma escada. Um vermelho ora verde na janela da 5. Eles sobem e descem aquelas e as outras escadas. Um som, um telão, já não era claro nem ainda escuro e eu sabia que a Multikulti na minha frente se batia para acontecer. Impávido e encantado, eu esperava a minha bailarina.
Sexta 26 setembro 2008, 18 às 22 horas. Sala 05 da Escola de Teatro. ...para nos encontrarmos, dançarmos, trocarmos informações e paixões interculturais. Fui convidado por Ciane. Para ela, um momento de criação e exercício de sua vida de dançarina. Para mim, uma chance de reencontrar a dança.
Sexta 26 setembro 2008, 14 horas e eu em casa sem saber o que visto, o que faço em seguida e o que ainda tinha que fazer para garantir a mim mesmo que lá estaria. Nos últimos anos, sempre dei um jeito de me esquivar para dentro da caverna quando o mundo me enchia de desejos. Alguns kilos mais gordo, dores aqui e acolá, a alma encarcerada num corpo de pedra. Sobrevivendo graças a chamas de lembranças mortas de tempos vivos. Mortas, eu disse mortas? Esta não estava. Há uma semana palpitava por esse encontro. A estátua e a dança, alguém já disse por aí... e essa imagem é que me movia.
Sexta 26 setembro 2008, 16 horas e eu na rua, no ônibus, barra, campo grande, jardins, plantas, canela, reitoria, bom preço, escola de teatro, jardim, banco, a estátua senta ali às 17:30 e espera a sua bailarina. Vejo tudo sem me sentir visto. Só uma estátua mesmo podia imaginar olhar sem ser olhada. De dentro, do fundo da caverna que eu habito, o mundo inteiro soa esconderijo. Sei que não é, mas vale o que eu sinto e não o que eu sei. Sei por exemplo qual é a sala 5, de outros carnavais, lembranças mortas por ali me assombrando. Atores e atrizes ensaiam algo em outra sala além. Altas entonações, cabelos e braços pelas janelas, atores e atrizes pelo jardim andando como passarinhos, pulinhos e beijinhos, giros, gritinhos. Pedaços de conversa voam como flechas sem me atingir. Alguém aparece de uma porta com uma escada. Um vermelho ora verde na janela da 5. Eles sobem e descem aquelas e as outras escadas. Um som, um telão, já não era claro nem ainda escuro e eu sabia que a Multikulti na minha frente se batia para acontecer. Impávido e encantado, eu esperava a minha bailarina.
Espaço Multikulti Bahia, 1a. chamada

Escola de Teatro lança versão baiana do Multikulti
Inspirado na rádio alemã e em performances em Nova Iorque, o Momento Multikulti pretende reunir atores, cineastas, massagistas, dançarinos, professores, estudantes e o público em série de workshops e perfomances.
O encontro é parte do projeto Tecnica Corporal, Tradição e Performance e conta com o apoio da Fapesb e do CNPq. O evento é inspirado na rádio berlinense multicultural e o formato, no Barefoot Boogie, Nova Iorque, onde pessoas dançam sem sapatos e improvisam das 20h à meia noite um sábado por mês. O espaço é aberto para massagens, improvisações, canto, poesia, conversas, vídeos, performances etc.
O 1o. Multikulti foi realizado dia 26 de setembro, das 18h às 22h na Escola de Teatro da UFBA (Canela).
Inspirado na rádio alemã e em performances em Nova Iorque, o Momento Multikulti pretende reunir atores, cineastas, massagistas, dançarinos, professores, estudantes e o público em série de workshops e perfomances.
O encontro é parte do projeto Tecnica Corporal, Tradição e Performance e conta com o apoio da Fapesb e do CNPq. O evento é inspirado na rádio berlinense multicultural e o formato, no Barefoot Boogie, Nova Iorque, onde pessoas dançam sem sapatos e improvisam das 20h à meia noite um sábado por mês. O espaço é aberto para massagens, improvisações, canto, poesia, conversas, vídeos, performances etc.
O 1o. Multikulti foi realizado dia 26 de setembro, das 18h às 22h na Escola de Teatro da UFBA (Canela).
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